SAFO
A primeira voz feminina na poesia
A primeira mulher a se transformar em uma figura histórica pelo seu talento literário, mais especificamente poético, foi Safo (ou Psafo, como ela própria preferia). Nascida em Eresos, e criada em Mitilene, ambas na ilha de Lesbos, no período que inicial do apogeu intelectual da cultura helênica, Safo é uma personagem de quem pouco se conhece – tanto sobre a vida, como também da obra – além de referências esparsas de outros autores e fragmentos de alguns de seus trabalhos.
Sua presença na cultura grega foi tão marcante que, dois séculos após sua morte, Platão – um dos pensadores que alicerçaram o pensamento ocidental – a chamou de “a décima musa”. Sabe-se que Safo nasceu em uma família rica e casou-se, ainda jovem, com Cercilas, com a qual teve uma filha, de nome Cleis. Pela referência de Tullius Láurea, a poetisa teria escrito nove livros de odes, elegias, hinos e epitalâmios (cantos para casamentos).
Não há registros seguros sobre seu nascimento e morte, mas acredita-se que Safo tenha vivido entre 625 a.C. e 580 a.C., sendo, portanto, contemporânea do rei Creso, dos poetas líricos Alceu e Stesichorus e do “contador de histórias” Esopo. Enquanto a poesia grega seguia firmemente pelo caminho das obras épicas e da glorificação de deuses e heróis, Safo dedicava-se a poemas absolutamente líricos, sobre o amor, a paixão e a morte.
Outro fato conhecido sobre a poetisa de Lesbos é que Safo ensinou música e poesia a um grupo de jovens de classe abastada, e que sempre dedicava a elas, quando casavam, uma ode especial. Vale lembrar que o papel da mulher na sociedade da antiga Grécia era, em geral, secundário e Safo, certamente, estaria muito à frente do seu tempo. Seus versos tinham um acento popular, sem artifícios desnecessários, beirando o coloquial.
Ao que se sabe, Safo, apesar da origem aristocrática, sempre incomodou os poderosos. Foi o caso de Pitaco, ditador que enviou Safo para dois exílios – o primeiro para a cidade de Pirra, afastada de Mitilene, capital de Lesbos, e outro para uma região fora da ilha. Antes dos 20 anos, a poeta grega já era conhecida por sua poesia e por sua verve política. Na época, também o poeta Alceu chegou a ser exilado.
O que restou dos nove livros de Safo mostra, por outro lado, uma poetisa que se preocupava com a métrica, a ponto de influenciar gerações de poetas futuros. Em seu primeiro livro, aparece a estrofe “sáfica”, formada por quatro versos – os três primeiros com onze sílabas, e o último com cinco. A poesia em língua portuguesa dedica a Safo um tipo de verso decassílabo inspirado em seus poemas – com acentuação na quarta e na oitava sílaba. Eles podem ser vistos, principalmente, em muitos sonetos.
A poetisa que questionava a morte - “eles (os deuses) também morreriam se a morte fosse uma coisa boa” – ultrapassou os limites do tempo, que fragmentou sua obra, mas não seu papel fundamental na poesia mundial. Mesmo tão distante no passado, Safo serve hoje de inspiração tanto para o movimento feminista, quanto para a causa LGBT.
(Parte da coletânea HISTÓRIAS DE POETAS, de William Mendonça. Direitos reservados.)